segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Desvaneça

O que eu fiz para merecer isso?
Quem fez isso comigo se não eu mesmo?
Desperdiçar meu tempo, meus estudos, minha paz, minha vida.
Eu preciso de ajuda. Se alguém se importa comigo, por favor me ajude.
Veja o que eu estou me tornando. Veja o quão fundo eu já desci no buraco. Em breve não haverá mais volta e eu definharei.
Eu, com todo potencial que outrora tinha, agora só sinto o vazio. Agora me acompanha apenas o meu choro, qual eu segurei por todos esses meses.
Que aprendizado que vale essa perda de si mesmo? Que lição vou aprender depois de me perder, sabendo que essa mesma já devia ter sido aprendida há tanto tempo.

Menina, sei que tu não estás nesse pedaço de papel, não em carne e osso, não em unhas e dentes, nem em pele e pelos, e por isso não escrevo diretamente para ti como indivíduo, mas para a imagem tua que vive dentro de mim e que me pesa como o fardo de Atlas.

Desvaneça.
Permita-me seguir o meu caminho.
Saia da frente do meu sol.
Não me tires o que não podes me dar, pois eu já te dei tudo que eu tinha. Te presenteei com os meus mais belos frutos enquanto esquecia de regar minhas árvores, e assim elas secaram e morreram. Mas eu sinto, sim, que ainda me restaram sementes vivas, daquelas que o Pai do Céu me entregou quando eu nasci.
Eu pretendo plantá-las, com todo o amor que brota em mim. Assistir seu crescimento dia a dia e florescer junto. Desejo também encontrar alguém que me ajude a cuidar delas assim como eu. Alguém que também possua um jardim fértil e vivo, no qual eu possa visitar, passear e me inspirar com o ar puro de um sentimento que verdadeiramente me faça voar.

segunda-feira, 4 de março de 2013

Descanso necessário

Silêncio. A serena calma de um descanso necessário. O momento em que me tiro do centro do palco e me torno um observador.
Muitos continuam a caminhada, muitos não pensam em descansar. Seguem seus caminhos e nem sequer percebem que estão sendo observados. O caminho é bem marcado. É necessária muita vontade para desviar o olhar dele e ver o que nos rodeia.
Deitado permaneço. Mesclo-me ao solo e às folhagens. Tornamos-nos muitos e estamos todos observando.
Insistimos em observar, há muita beleza no caminho.
A beleza me vê e sorri para mim. Torna-se a compreensão. A compreensão também deseja descansar conosco. Venha, aqui é tudo pacífico e simples, como na planície de onde viemos... Lembra-se?
A compreensão une-se ao desejo e se vai, seguindo o caminho. O tempo se inquieta. O vácuo da vontade me impulsiona, não estou mais cansado.
Volto a caminhar.

domingo, 3 de março de 2013

Relato encontrado nas ruínas de Langerhan



Não tivemos muito tempo de sossego após nossa chegada no Castelo de Langerhan. Nossa primeira manhã acordou serena e graças à isso pudemos desfrutar por uns instantes da arquitetura mística e misteriosa daquele monumento: Era como um labirínto psicológico, aqueles que te confundem com sinais e jogos mentais, e não com charadas ridículas, portas falsas e becos sem saída. Irônicamente, foi exatamente num canto assim que eu e o meu instrumento nos encontramos. Ele estava encostado contra a parede na qual pendia um retrato de um instrumentista da época em que a realeza ainda habitava nesse castelo, um alaúde. Estava um pouco surrado, obviamente. Parecia ter sido usado décadas inteiras pelas mãos de um músico que, quando se comparava os desgastes causados pelo tempo, como umidade e e calor, com aqueles originados pela árdua prática do instrumento ao manuseá-lo, evidênciava uma extrema suavidade quando tocava suas melodias.
Eu roubei-o para mim. Meus instinto musicais não se conteram, e por pouco tempo tive que mantê-lo escondido do resto do batalhão, que de maneira alguma entenderia um ato desses em meio à guerra. Na verdade foi bem fácil impedir que a atenção deles se voltasse para os meus atos, pois ao notar as primeiras marcas de sangue na parede e corpos caindo no chão, percebi que estávamos sendo atacados.
Minha alma entrou em choque. As lembranças musicais da minha infância evocadas por aquele instrumento haviam acabado de reviver em mim uma criança inocente que agora carregava um fuzil em meio à um inferno de explosões e caos. Entre a tempestade de projéteis, pedaços de construção e sangue eu corri pelas escadas até meu amigo Barret, que estava em cima do muro interno do castelo, carregando comigo o alaúde enrolado à trapos. De cima do muro, entre as fendas das paredes pudemos visualizar a verdadeira sentença do nosso batalhão.
Eu caí no chão e abandonei meu fuzil, entretanto abraçei o alaúde como se fosse a maior fonte de segurança do momento, e pouco mais me lembro do que aconteceu em seguida, nada muito além da minha farda cheia de poeira e sangue e os gritos e estalos das armas de fogo cessando aos poucos. No fundo podíamos ouvir aquela linguagem desconhecida dos soldados inimigos berrando ordens e outras manifestações de sentido incompreensível. Haviamos sido derrotados.
Percebemos muito antes dos nossos colegas que deviamos parar o combate e nos render. Sem dúvidas foi o certo a se fazer, pois a morte foi o destino de todos  que continuaram lutando, cegos pelo ódio de estarem perdendo tudo, amigos, famílias, amores, e agora até a vida, para essa guerra sem sentido.
Barret e eu fizemos tudo que pudemos para nos manter escondidos dos inimigos, mas de forma ingênua, como avestruzes mantendo a cabeça enterrada e acreditando que não estavam sendo observados. Quando retornamos à realidade nos vimos rodeados pelos nossos predadores famintos, os quais não hesitaram em nos deter. Tentamos nos comunicar com eles a fim de implorar pela sobrevivência, mas estávamos convencidos de que não nos entenderiam. Por sorte aquele que aparentava ser o líder deles aproximou-se de nós e mostrou conhecer nosso idioma: “Venham”.
Seguimos como escravos. Barret levava seu fuzil vazio pendurado pela bandoleira e eu carregava o alaúde mumificado em meus braços, enquanto os soldados me olhavam com uma mistura de desprezo, pena e curiosidade envoltos num ar cômico, como se eu fosse algum tipo de piada mal contada. Aparentemente devo tudo à aquele instrumento musical, pois graças à aparente piada que eu me tornei fui deixado de lado, aos cuidados dos subordinados, enquanto o líder inimigo iniciou o interrogatório com Barret, imaginando que esse teria mais informações do que eu. Sabíamos que nada adiantaria a tortura, não tinhamos nada. Nenhuma informação valiosa, nenhuma posição de base secreta, nenhum nome de comandante ou a data do “nosso” próximo ataque. Para ser bem sincero, eu só sabia o nome do meu amigo por que pude ver a inscrição na sua coleira, pois quando eu procurei pela minha, e não encontrei, eu percebi que não lembrava do meu próprio nome!
A primeira impressão amigável que o líder dos inimigos passou por conhecer nossa língua logo foi desiludida pela agressividade com que este começou a berrar e socar Barret. O interrogatório sem sentido continuou incansávelmente com este suportando todos os golpes graças à sua vontade de aço. Conseguiu manter a frieza por uma meia-hora. Depois disso o promotor do terror se cansou e ergueu sua arma para mirar na cabeça de Barret, afirmando que o mataria. Isso soou como um problema, não era um blefe. Qualquer militar experiente sabe quando seu interrogado é inútil e sem valor, e além disso, assistir ao assassinato do meu único parceiro fatalmente me afundaria num pânico incontrolável no qual eu, se soubesse, entregaria todas as informações que eu sabia.
Certamente esse seria o começo do pesadelo real, mas de súbito as coisas tomaram outro rumo. Eu ouvi um som parecido com o de uma flecha lançada por um nativo norte-americano e de repente todos fomos socados por uma forte onda de vento em meio aos escombros. Quando um míssel passa ao seu lado, você não escuta a explosão, apenas o assobio e as paredes se despedaçando atrás de você. Muitos soldados foram feridos nessa explosão, e quando abri meus olhos não vi muitas coisas além de muita poeira no ar iluminada pelo sol, que impossibilitava a visão à longa distância, e aquele grito ensurdeçedor ainda soando na minha cabeça.
Milagrosamente o alaúde encontrou-se perto de mim e ainda enrolado em pano, de forma que quando me aproximei para pegá-lo este me mostrou a saída formada pelo míssel nas paredes que seguiriam meus passos. Corri o máximo que pude. Em momentos como esse o corpo libera uma quantidade inimaginável de adrenalina e dopamina, por isso consegui correr uns 5km sem parar até começar a sentir a dor das minhas lesões.
Longe daquele inferno eu ainda podia ver a fumaça subindo para o alto. Encontrei abrigo perto de um rio em uma floresta, onde tirei minha roupa e me banhei. Eu sabia que ia começar a doer muito brevemente, mas agora eu estava à salvo. Tive um tempo para refletir em tudo que tinha acontecido, mas não quis lembrar. Em breve a guerra acabaria, já estava destinada, e agora eu não me importava mais com quem ia sair vitorioso no fim daquela podridão. Quanto à Barret, bom, não precisava me preocupar. Barret saberia o que fazer. Não foram poucas as vezes em que ele mostrou ser muito mais hábil do que eu para lidar com situações complicadas sem se desesperar. Ele sairia vivo.
Eu finalmente desembrulhei o alaúde mágico e pude desfrutar da essência espiritual encarnada nos simbolos e inscrituras cravadas na sua antiga madeira, e em seu braço jazia a inscritura do nome do compositor barroco Dietrich Buxtehude. Agora eu tinha uma nova vida para seguir em frente, novas terras. As águas do rio trouxeram uma nova razão para a minha existência. Toda aquela cor em volta, a energia pulsante da natureza, o som da água correndo e dos pássaros cantando, o musgo crescendo nas pedras do rio, os animais vivendo harmoniosamente com as plantas, o sol brilhando majestosamente no céu, a certeza de que a paz sempre prevalece.
Tudo isso começou a fluir em mim e regeneraram cada partícula do meu ser, e, quando percebi, o alaúde estava também completamente restaurado pela magia da natureza, e suas cordas prateadas agora ressonavam harmoniosamente com as vibrações que se continham na calma do ar, aguardando pelo momento em que minhas mãos finalmente pudessem sentir e reger sua tensão.
Eu sentei, abraçei-o, e comecei a tocar.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Valsa sobre o gelo

Vaga-lumes cor de bário cintilante
Dançam sobre o translúcido lago de cristal.
Suas luzes reluzem assim distantes
Nos diamantes esquecidos da fossa abissal.

Seu brilho há muito cega,
Sua forma bela consome
Feixes finos luz de vela
Lá atraídos por sua fome.

Encantados com a música que os distraem
Dançam em pares no etéreo gasoso.
Suas luzes e movimentos que os atraem
São obras de arte ao momento amoroso.

O tempo passa e o vento muda,
Leva a calma embora voando.
Traz consigo uma grande chuva.
Enfraquece o fogo um dia brando.

E com isso, um deles cai
Mergulhando no sólido frio
Mas seu brilho, que nos atrai,
Ainda vive no abismo sombrio.




In Natura

Sobre o caos impõe-se a ordem,
As palavras por si só dão-se vencidas,
Assim se parece, pois cedo fogem
Se no exato momento não forem escritas.

Aproveita, então, de boa forma, o tempo,
Subindo altas montanhas e descansando contra o vento.
Sinta as as minúsculas gotículas que o vento leva
Da água celeste que hoje nos rega.

Olhe bem para aquela flor, vermelha e sem louvor;
Suas pétalas não mais ergue, nada vale o seu calor,
Um perfume ainda exala, mas de longe nada sinto,
Não me ouso aproximar, tampouco a vejo vindo.

E como é belo, me surpreendo, o canto dessas pequenas
Formas de vida que voam exibindo vossas penas.
No acaso me pergunto: O que teriam a dizer
Sobre o ar e a água que vivem no meu ser?

Nada dizem, nada sabem, seu canto cessa no instante.
A chuva segue a diante, fortes pingos logo nascem.
Está chorando, grande nuvem? O que teus gases trazem?
Mostra-me de novo, se puderes, aquele azul brilhante.


segunda-feira, 1 de outubro de 2012

E por quê não?

Vocês se despediram , eu me despedi, e então seguimos juntos um caminho. Era interessante notar que não eram os nossos próprios passos que guiavam nosso caminho pois eramos carregados e arrastados, como um casal nobre que em uma carruagem sendo conduzido por servos, ou parte da realeza indiana sentada em tronos no alto de um enorme elefante.
De repente sentimos que aquilo era o que devia ser feito. Para ser sincero, talvez eu só tenha percebido isso depois que me deixei levar por você: Jogou-se aos meus braços e e beijou a minha boca como se fosse a única que existisse na sua vida. Entre as mordidas e os suspiros, por aqueles momentos que nossas bocas se separavam para respirar, eu pensava no crime, no pecado que estávamos cometendo. Eu sabia disso plenamente, mas eu não conseguia dizer, por mais que eu quisesse, as palavras não sairiam.
"Ele já está longe, não pode nos ver. Você sempre quis isso, não? Seu corpo não consegue esconder, está em chamas, e agora seu sexo rígido aponta para mim e clama pelo meu calor. Agora você é meu."
Lentamente sua boca se afastou da minha , mas antes que eu pudesse dizer qualquer coisa senti a sua língua provando o gosto da minha fertilidade, por todo o caminho, sem cessar, repetidamente, sem desperdiçarmos um segundo.
Agora compartilhamos esse pecado. Não nos vimos mais, e sei que não devemos, a fim de evitar o sentimento de culpa. Entretanto não perdemos a esperança, pois ambos sabemos que teremos a eternidade disponível para nos amarmos quando finalmente nos encontrarmos no inferno.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Abril de 2012

É verdade. Ainda sinto aquele mesmo êxtase que senti durante as primeiras palavras que trocamos. Seria desonesto de minha parte negar que sua voz e seu olhar ainda são, para mim, a maior fonte de inspiração  e prazer que tenho. São sempre momentos tão breves e inesperados, mas só de vê-la minhas esperanças fervem e me movem para arquitetar uma forma de me aproximar mais de ti, e já não me surpreendo de ver que nenhuma ideia minha nunca nem se aproxima da beleza que você merece, de todo resplendor que eu gostaria de te proporcionar. Não, o que realmente me surpreende é a forma que meu desejo se volta para você sempre que se move em minha direção, por mais sutis que sejam seus passos.
A verdade é que ainda sonho com a sua presença e seu sorriso, com o envolvimento dos nossos corpos desfrutando do beijo que nunca foi dado, que me deixa feliz o dia inteiro depois de acordar. Confesso também que me sinto mais feliz a cada palavra que troco contigo, que me faz sorrir todo resto do dia... Me sinto tão feliz que contagio todos com felicidade e chamo a atenção de muitas outras garotas com essa felicidade... Mas raramente a sua, a mais importante e a única que realmente desejo.
Não é como se eu não me esforçasse ou você não dificultasse, claro, mas afinal, como podem me escapar as esperanças se, quando estou prestes a esquecê-la, você volta e me conquista novamente com apenas um relance?!? Ahh, ainda me lembro da última vez: Em uma noite boemia, apenas um toque seu seguido de sua presença mudou o rumo do meu mundo, e nesse dia eu consegui, por aqueles instantes, esquecer de todas as pessoas que estavam à nossa volta e viver apenas com você na minha cabeça, pois você estava ali, falando comigo. AH! O que eu não daria por um momento no qual eu pudesse realmente falar contigo e me expressar profundamente da forma certa, dizendo a você o que quero, que quero te conhecer e que você me conheça... de uma forma boa, pois temo que tudo que foi mostrado por mim não consegue brilhar através da cortina, da fumaça densa de medo que senti, que eu costumava sentir, que eu ignorei na última vez que nos falamos.
Como posso eu perder as esperanças se um dia eu te disse que não desistiria de você? Eu não quero...
Eu vou conseguir... Eu quero muito...